sábado, 10 de janeiro de 2015

Um vento estranho




Eu só preciso de um lugar para ser imortal. Daqueles inatingíveis e inexplicáveis.  Pequenos e aconchegantes. Ensurdecedores a ponto de não se ouvir ou sentir.

Os sentidos, nesse lugar, são mera premência de sonho. Tudo ocorre na alma. Nada se materializa. Nada se vê. Tudo se enxerga. Nada se ouve. Tudo se escuta.

Trata-se de um lugar com uma lareira e um sofá grande para se esparramar. Daqueles que permitem o esticar de todo o corpo, em que nenhum membro sai prejudicado nesse exercício do tato.

As parcelas de vida estão todas no lixo. O pedágio da estrada é a completude. É preciso ser inteiro. De preferência, inteiramente vazio. Prepotentemente ignorante frente a qualquer coisa. Uma página em branco.

Não ser para não morrer  é não viver para existir. A metáfora da imortalidade é a explicação perfeita para os questionamentos físicos. A metafísica da existência nada mais é do que o sabor do vento. A harmonia consonante entre o cantar dos arvoredos e o impulso do vento dos pássaros.

Tarefas comutadas. Estrofes em eterna construção. Poemas intermináveis feitos de argamassa vencida e tijolos frágeis. Não sustenta explicações. Alimenta desmoronamentos. Tendencia à reconstrução.

Preciso de um lugar para ser imortal. Um lugar que acaricie minha respiração com uma massagem bem no dorso da alma. Daquelas que mandam embora o mau jeito do espírito, desencadeado por uma falta de fé que desloca as juntas. Que permanece de aluguel nas costas dos dias, embarreirando a passagem de sopros de vitalidade.

Para ser vida é preciso ser morte. Para ser imortal é preciso aceitar a mortalidade. A imortalidade de minha varanda será a abertura a qualquer ameaça de chegada. Varanda de fazenda grande que se enxerga de longe, com uma cadeira de balanço a embalar o tempo materializado. O corpo imortal já morto.


Ser mortal para viver para sempre. Respirar pela última vez para ter o comportamento eterno da falta de ar. Todos são imortais. Sempre haverá uma compleição eterna. A acepção que termina é imortal. Deixar de ser é uma condição eterna. Morrer é eterno. Ser imortal ultrapassa o que se conhece por vida.


THIANE ÁVILA. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário