segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

A reserva da míngua



A metralhadora de existências massacra o curral das lembranças. Não há espaço para as experiências. O tempo míngua em antagonismo com as premências. Um infortúnio aos pagadores de injúrias. Uma pena aos excessivos de vivências.

Borges já pressentiu ser a criação uma experiência da memória, mas nem toda a memória uma experiência da criação. Há tantos subordinados vivos da morte. Preocupações aleatórias de uma falta de planejamento secular. Uma rotina deliberada rumo ao não solucionamento de nada. Morrendo com excesso de vida.

A vida, pois, é doença contagiosa. Memórias, a Nejar, são projeções de eternidade. Santas promanações memoriais jogadas fora pela escassez intempestiva das horas, que desfortuna as almas com sede. Precoce partida da vida que tanto tem a contribuir. Tardio desaparecimento da existência que não agrega.

O conhecimento pode matar a ação. Mutilados já foram pela demasia demanda de sonhos e inventos, cuja realidade não chega nem aos pés. Voltar, pois, ao tempo fabuloso dos começos para organizar orgias entre gênios. Garantia de continuidade da raça. Literatura escrita no código genético.

Mitos em constante guerra com as verdades que, mais tarde, também transformam-se em mito. Míngua do tempo que obriga a reserva da história. O enlace de novos enredos que somam. A realidade se inventa no que falta.

Tudo ao ser nomeado é vivo. Não há desexistência em neologismos. Toda a sinapse que procria é vida em potência. Dicionarizar a existência é uma mera premência de ordem. Poesia é, no entanto, desordem. Poeta não consta no dicionário.


O hiato dos extremos é a felicidade. Breve e resplandecente clarão de ingenuidade que inunda a genialidade pausada pelo tempo que, não bastasse, ainda míngua. Não há saída na procura da catarse. Semblante de luz já se fez escuridão no intervalo entre início e o fim dessas palavras.

THIANE ÁVILA.

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